Porque a surdez prejudica a fala?

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A surdez severa ou profunda impacta a fala de maneira significativa. A dificuldade se estende à percepção de sons vibrantes, como os sonoros, e à articulação correta de fonemas produzidos na parte posterior da boca, como o R e o K.

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O Impacto da Surdez na Aquisição e Desenvolvimento da Fala: Um Olhar sobre a Percepção e a Produção

A surdez, principalmente em graus severo ou profundo, impacta profundamente o desenvolvimento e a qualidade da fala. A crença comum de que a surdez apenas impede a audição é uma simplificação excessiva. Na verdade, a ausência ou redução significativa da audição afeta diretamente a capacidade de perceber e reproduzir os sons da fala, gerando um ciclo de dificuldades que podem se tornar crônicas se não houver intervenção adequada.

A relação entre audição e fala é intrínseca e começa muito antes do que imaginamos. Ainda na fase pré-linguística, bebês ouvintes desenvolvem a percepção fonológica, aprendendo a discriminar os sons da língua materna. Através da audição, eles internalizam padrões rítmicos e melódicos da fala, construindo a base para a produção futura. Um bebê surdo, privado desse input auditivo crucial, não tem a mesma oportunidade de desenvolvimento fonológico.

A dificuldade na aquisição da fala em indivíduos surdos se manifesta em múltiplas esferas:

1. Percepção Auditiva e Discriminação Fonêmica: A incapacidade de ouvir claramente os sons da fala impacta diretamente na capacidade de diferenciá-los. Fonemas como /p/, /b/, /t/, /d/, /k/ e /g/, que apresentam diferenças sutis na sua produção, tornam-se indistinguíveis para o indivíduo surdo. Esta dificuldade na discriminação fonêmica se estende a outras classes de sons, como as consoantes fricativas (ex: /f/, /s/, /ʃ/) e as consoantes africadas (ex: /tʃ/, /dʒ/). A distinção entre sons vibrantes e não vibrantes também é comprometida, acarretando em dificuldades na produção de fonemas como o “R” e o “L”.

2. Articulação e Prosódia: A fala é um ato motor complexo que envolve a coordenação precisa de diversos músculos da boca, língua, lábios e garganta. A falta de feedback auditivo contínuo prejudica o desenvolvimento e a precisão dessa coordenação. A criança surda, incapaz de monitorar a própria produção sonora, pode apresentar dificuldades na articulação dos fonemas, resultando em fala imprecisa e menos inteligível. A prosódia (ritmo, entonação e melodia da fala) também é afetada, tornando a comunicação menos natural e fluida. Fonemas produzidos na região posterior da boca, como os já mencionados “R” e “K”, são particularmente desafiadores devido à menor percepção tátil e visual da sua produção.

3. Vocabulário e Fluência: As dificuldades na percepção e produção fonológica impactam diretamente na aquisição e uso do vocabulário. Com menor compreensão da fala, a criança surda pode ter um vocabulário mais limitado e dificuldades em construir frases mais complexas. A falta de fluência também pode ser observada, devido às dificuldades em processar e planejar a fala.

Em resumo, a surdez não afeta apenas a audição, mas sim todo o processo de desenvolvimento da fala. A intervenção precoce, através de estratégias como a implantação coclear, o uso de aparelhos auditivos e a terapia fonoaudiológica, é fundamental para minimizar os impactos da surdez e promover a melhor aquisição possível da linguagem oral. Quanto mais cedo for o início da intervenção, maiores serão as chances de sucesso na aquisição e desenvolvimento de uma fala clara e inteligível.