É verdade que a palavra saudade só existe no português?

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Embora a saudade seja frequentemente considerada única ao português, pesquisas indicam o contrário. A palavra inanguôró, presente no vocabulário da língua indígena Guaná ou Chané, apresenta significado equivalente, demonstrando que a expressão de tal sentimento transcende fronteiras linguísticas. A descoberta amplia a compreensão da complexidade e universalidade da emoção humana.

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A Saudade não é tão única assim: Desvendando a universalidade de uma emoção

A palavra “saudade” é frequentemente apresentada como um exemplo único da riqueza e complexidade da língua portuguesa. A suposta impossibilidade de traduzi-la perfeitamente para outras línguas, capturando sua nuance melancólica e nostálgica, reforça essa ideia de singularidade. No entanto, essa percepção, embora romântica, precisa ser matizada. A verdade é que, apesar da profunda singularidade da forma como a saudade se expressa em português, o sentimento que ela designa não é exclusivo de nossa língua ou cultura.

A crença na exclusividade da saudade se sustenta em sua capacidade de evocar uma gama complexa de emoções: a lembrança afetiva de pessoas, lugares e momentos passados; a mistura de alegria e tristeza pela ausência; a esperança de reencontro e o sabor agridoce da memória. Essa riqueza semântica dificulta a tradução direta para outras línguas, levando muitos a acreditar em sua singularidade.

Porém, pesquisas etnolinguísticas demonstram que a expressão de sentimentos análogos à saudade existe em diversas culturas e idiomas. Um exemplo notável é a palavra inanguôró, presente na língua Guaná ou Chané, falada por um povo indígena do Paraguai e da Argentina. Esta palavra, segundo estudos linguísticos, captura com precisão a mesma gama de emoções complexas que a saudade portuguesa representa, indicando a existência de um sentimento similar, expresso de forma diferente, em um contexto cultural completamente distinto.

A descoberta de termos como o inanguôró nos impulsiona a repensar a questão da singularidade da saudade. Não se trata de negar a riqueza semântica e a beleza da palavra em português, mas sim de reconhecer que a emoção que ela representa é, na verdade, uma experiência humana universal. A forma como essa experiência é codificada linguisticamente varia de cultura para cultura, mas a essência do sentimento – a nostalgia pela ausência, a mistura de alegria e tristeza pela memória – permanece constante.

A existência do inanguôró e de outras palavras com significado semelhante em diversas línguas do mundo demonstra a complexidade da relação entre linguagem e emoção. Ela nos lembra que, embora a língua molda nossa experiência e a maneira como a expressamos, as emoções humanas fundamentais transcendem as barreiras linguísticas e culturais, conectando-nos através de uma experiência compartilhada, mesmo que expressa em palavras diferentes. A saudade, portanto, não é uma ilha linguística isolada, mas sim um elo numa cadeia global de sentimentos humanos.